Dissonâncias de Ritmo - Fugas para Felisberto


Ao ritmo melódico do bandonéon, juntam-se palavras múltiplas. Mistura da voz sul-americana do Felizberto com a nossa, traduções que não são mais que adaptações, transfigurações, uma massa disforme sem autor definido. Cada conto é um mapa que nos leva numa viagem estranha, saltos espácio-temporais. Viagens em sobressalto, apresentadas num peculiar almanaque-cartográfico

livro totalmente manufacturado.                                                                                                           técnica mista, com cartolina, bolsas de papel kraft, papel especial 45g

prefácio


Dissonâncias de Ritmo - Fugas para Felisberto


Traduzir é atravessar o tempo.

O que importa é, segundo parece, não apenas as meras palavras, mas a sua entoação, a presença que as rodeia e confirma. Como o nascimento é dos momentos mais entusiasmantes para apreciar, tenho o cuidado de o transportar e repetir tantas e tantas vezes até que se confunda o seu lugar exacto. Sentindo as suas variações espacio-temporais. Os seus matizes, a textura dos espaços. Escrevi para que estes textos tenham múltiplos pontos de apoio físico, momentos que brotassem livremente, podendo até desaparecer de seguida. Seduz-me certa desordem que encontro na realidade e nos aspectos do seu mistério. Sou um espectador ávido, surpreso, em sobressalto mesmo nos momentos em que a acção é furiosa, complicada. Talvez o que aqui se apresenta não seja de todo uma tradução - obviamente - mas, antes de qualquer coisa, adaptações de histórias. Foi provavelmente o acaso que nos pôs em contacto com estas histórias e que, invariavelmente, me guia em forma de espelho deformador (esperpento?) enquanto as vamos distorcendo, adaptando, traduzindo. Como uma Fuga, várias vozes em camadas sobrepostas, conferindo uma textura mais complexa. Repetição do tema, inversão do tema, espelhando-o, modelando-o, expandindo-o, transportando-o. Uma marcação de pontos de passagem. Esta reinvenção em contínuo movimento não é mais que outro simulacro, um simulacro de vidas através de símbolos, inventos e palavras, testemunhos de estranhamento do mundo aparentemente real. Histórias-mapas, almanaques de transfiguração. Deixo-me levar constantemente, sempre me deixo conceptuar. Não só viajo percorrendo cidades, mas também por todo o resto que não se dá atenção. Talvez eu seja como o pato, não voa, não corre, não nada. Então direi que fui (sou) por vezes um pato alegre, por vezes um pato triste. Alguns até me verão como um pato extraviado. E que às vezes me sinto inefável no meu extravio. Quem me tolera sente curiosidade pelos ritmos e elementos heterogéneos que desfilam e se transformam nas minhas realidades. Assim sendo, não há tradução, ou traduções, só algo de invenção que não se pareça a nada. Como o pato....Nem um nem outro.


Ao Felisberto Hernández 

                                                                                                                     escritor, poeta e pianista uruguaio (1902-1964)                                                                         veio ao nosso encontro em Buenos Aires e tem viajado connosco desde então


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